segunda-feira, 16 de julho de 2012

PRIMEIRAS ESCRITORAS NEGRAS BRASILEIRAS

O livro mais antigo escrito por uma mulher negra nos Estados Unidos data do século XVIII, Poemas sobre vários assuntos, religiosos e moral, de Phillis Wheatley, publicado em 1773. No Brasil o livro mais antigo, de que se tem notícia, escrito por uma mulher negra, seria de Rosa Maria Egipicíaca da Vera Cruz, se o manuscrito não tivesse sido quase totalmente destruído por seu confessor quando a ex-escrava foi acusada em 1763 de heresia e falsa santidade. Segundo seu biógrafo Luiz Mott, o livro possuía mais de 200 páginas, algumas escritas por ela, outras ditadas a uma outra religiosa e versava sobre às visões e pensamentos de Rosa. Tinha por título Sagrada Teologia do Amor Divino das Almas Peregrinas. Assim como Phillis Wheatley, Rosa nasceu na África e foi trazida para o "novo mundo" como escrava. Phillis tinha 8 anos e Rosa apenas 6 anos.

Quando foi presa pela Inquisição, Rosa afirmou que era natural da Costa de Mina, e da nação courana. Aportou no Rio de Janeiro em 1725, onde permaneceu até os 14 anos, sendo aí deflorada pelo antigo proprietário e posteriormente vendida para Minas onde viveu por quase duas décadas como prostituta. Devido às possessões e visões, a escrava foi examinada por uma junta de teólogos e exorcistas, sendo considerada embusteira e por isso açoitada. Temendo novas represálias, mudou-se para o Rio de Janeiro levada pelo seu confessor, ex-exorcista e co-proprietário, onde fundaram o Recolhimento do Parto, em 1751, destinado a mulheres pobres, parte delas negras e mulatas.

Naquela cidade as visões e profecias de Rosa continuaram, devotos passaram a disputar as suas relíquias, até que o então bispo do Rio de Janeiro mandou que fosse presa e enviada para Lisboa a fim de ser interrogada pela inquisição.
O fato de Rosa não só saber escrever - aprendeu a escrever e a ler com mais de 30 anos, obrigada por visão celestial - , como o de ter iniciado um livro, deve ter tido enorme repercussão junto a seus fiéis, pois consta que havia um quadro, no altar do Recolhimento do Parto no Rio de Janeiro, representando sua figura com o Menino Jesus no colo de uma pena e uma caneta na mão.

Até meados do século XIX, o Brasil parece não ter conhecido nenhuma romancista nativa. Alguns autores consideram Teresa Margarida da Silva e Orta (1711 ou 12-1793), autora de Aventuras de Diófanes (l752),. como sendo à nossa primeira romancista, afirmativa que considero exagerada, pois ela,. embora tenha nascido em São Paulo, teve toda sua formação em Portugal, onde viveu desde os 4 anos de idade e onde estudou, se casou, teve seus 12 filhos, enviuvou, foi presa e morreu.
Pelo lado materno, Teresa possuía ascendência negra. Ernesto Ennes (1944), seu principal biógrafo afirma que a ascendência negra de D. Catarina (mãe da escritora) remontava ao 6º ou 7º grau.

Talvez esteja aí, na própria biografia de Teresa Margarida, a primeira dificuldade com a qual vai se deparar o pesquisador interessado na literatura escrita por negros no Brasil: quem considerar como escritora negra. Quem tem ascendência negra, como Teresa Margarida? Quem tem ascendência negra e aparenta ser negra? Quem tem aparência e ascendência e se considera negra? ou ainda: quem além da ascendência, aparência, se vê como negra, e escreve sobre negros? Voltarei a estas questões ao longo deste artigo.

Para alguns estudiosos Maria Firmina dos Reis, autora de Úrsula, seria a nossa primeira romancista. Caso esta afirmativa seja comprovada, a primeira romancista brasileira seria mulata, como, aliás, o precursor do romance brasileiro, Teixeira e Souza.

Maria Firmina dos Reis nasceu em 1825, em São Luís do Maranhão. Com pouco mais de 30 anos, em 1859, publicou Úrsula, sem contudo colocar o seu nome na capa, escondendo-se sob o pseudônimo de "uma maranhense". O livro conta à história de um amor infeliz entre uma órfã e um bacharel de Direito. O negro, enquanto escravo, tem presença marcante no livro. Embora a escravidão não seja o assunto principal do romance, os escravos têm um papel importante na trama, .possuem uma história, um passado, além de sentimentos nobres.

A narradora denuncia a violência do sistema escravista e questiona a sua legitimidade. Os escravos eram arrancados da terra natal, transportado como animais nos navios negreiros, reprimidos sadicamente em caso de justa revolta, .e separados de suas famílias, sem respeito algum aos seus sentimentos. Trabalhavam sem descanso, nem alimentação, roupas ou moradia adequadas. O já difícil cotidiano vivido pelo escravo tornava-se pior, devido às arbitrariedades sem limites praticadas pelos proprietários.

É preciso lembrar da posição corajosa de Maria Firmina ao denunciar a ilegitimidade e violência da escravidão, justamente no Maranhão, província que era considerada como sendo fortemente escravista. O fato de o vilão da história, aquele que persegue a irmã, mata o cunhado e o pretendente da sobrinha, ser o pior e mais cruel dos senhores, não quer dizer que a escravidão seja legítima para os escravos que possuem um bom senhor. Túlio e Suzana, escravos de Luiza B., proprietária boa e compreensiva não aceitam sua condição de "míseros e cativos".

Maria Firmina situa-se ao lado daqueles autores que condenam a escravidão porque ela era contrária às leis de Deus, e que acreditavam que o negro, apesar dos anos vividos sob o cativeiro, não tinha perdido as suas qualidades naturais. Difere neste ponto de autores contemporâneos, como Macedo, que condenavam a escravidão, dentre outras razões, porque ela corrompia o escravo e conseqüentemente contaminava a família branca.

A autora publicou, em 1887, um conto também abolicionista, chamado A escrava. O regime servil continua violento, separando a mãe dos filhos, escravizando pessoas de cor livres, colocando crianças na mais tenra idade no trabalho. Apesar de ter sido publicado já nas vésperas da abolição, quando os escravos no Sul abandonavam em massa as fazendas, os personagens escravos mantêm o mesmo perfil: fiéis, honestos, submissos, humildes e gratos. Será que a insistência da autora neste perfil escravo não significaria um alerta aos senhores de que, com a liberdade, os escravos não iriam se voltar contra os antigos proprietários?

A militância de Maria Firmina, segundo seu biografo Morais Filho, foi além da escrita: recusava-se a andar de palanquim, pois acreditava que "negro não era animal para se andar montado nele!" Publicou, ainda, um livro de versos românticos, e compôs letra e música de gosto popular, como hinos, valsas e autos para pastoral e bumba-meu-boi. Já nonagenária, morreu na casa de uma ex-escrava.
fonte;http//cucamott.sites.uol.com.br/escritorasnegras.htm
MARIA FIRMINO DOS REIS

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